Duas
são as fases em que se pode dividir a vida de Allan Kardec: a primeira, como
consagrado professor Rivail; a segunda, como o Codificador do Espiritismo.
Destacaremos, a seguir, os aspectos mais importantes de sua trajetória pela
Terra.
1 – O menino Hippolyte
1.1 – Nascimento
Allan
Kardec, cujo verdadeiro nome é Hyppolyte Léon Denizar Rivail, nasceu na cidade
de Lion (França), dia 3 de outubro de 1804, no seio de antiga família lionesa,
de nobres e dignas tradições.
Foram
seus pais Jean-Baptiste Antoine Rivail, magistrado íntegro, e Jeanne Louise
Duhamel. O Futuro codificador do Espiritismo recebeu um nome querido e
respeitado e todo um passado de virtudes, de honra e probidade. Grande número
de seus antepassados se tinham distinguido na advocacia, na magistratura e até
mesmo no trato dos problemas educacionais. Bem cedo, o menino se revelou
altamente inteligente e agudo observador, denotando franca inclinação para as
ciências e para os assuntos filosóficos, compenetrado em seus deveres e
responsabilidades, como se fora um adulto.
1.2 – Primeiros Estudos : O Instituto de Yverdon
Conforme
nos conta Henri Sausse (Biógrafo de Kardec), Rivail realizou seus primeiros
estudos em Lion, sua cidade natal, sendo educado dentro dos severos princípios
de honradez e retidão moral. É de se presumir que a influencia paterna e
materna tenham sido das mais benéficas na sua infância, constituindo-se em
fonte de nobres sentimentos. Com idade de dez anos, seus pais o enviam a
Yverdon, cidade suíça do cantão de Vaud, a fim de completar e enriquecer sua
bagagem no célebre Instituto de Educação ali instalado em 1805, pelo professor
filantropo João Henrique Pestalozzi. Frequentado todos os anos por grande
número de estrangeiros, citado, descrito, imitado, era, numa palavra, a escola
modelo da Europa.
Altas
personalidade políticas, cientificas, literárias, filantrópicas voltavam
maravilhadas de suas visitas ao famoso instituto. Louvaram o criador dessa obra
revolucionaria, e por ela também se interessaram Goethe; o rei da Prússia,
Frederico Guilherme III, e sua esposa Luísa; o Czar da Rússia, Alexandre I; o
rei Carlos IV da Espanha; os reis da Baviera
e de Wurtemberg; o imperador da Áustria; a futura imperatriz do Brasil,
D. Leopoldina de Áustria, e muitos expoentes da nobreza europeia e do mundo
cultural.
O
menino Denizar Rivail, ao qual os destinos reservariam sublime missão, logo se
revelou um dos discípulos mais fervorosos do insigne pedagogista suíço.
Possuidor de inteligência penetrante e alto espírito de observação, e, ainda
mais, inclinado naturalmente para a solução dos importantes problemas do ensino
e para o estudo das ciências e da filosofia, - Rivail cativou a simpatia e a
admiração do velho professor, deste se tornando, pouco depois, eficiente
colaborador. Os exemplos de amor ao próximo fornecidos por Pestalozzi (pra quem
o amor é o eterno fundamento da educação) noteariam para sempre a vida do
futuro Codificador do Espiritismo. Aliás, até mesmo aquele bom-senso, que Flammarion
com felicidade aplicou a Rivail, foi cultivado e avigorado com as lições e
exemplos recebidos no Instituto de Yverdon, onde também lhe desabrocharam as
ideias que mais tarde o colocariam na classe dos homens progressistas e dos
livres-pensadores.
2
– O Professor Rivail
2.1 – As obras didáticas
Sem
dúvida, chegando à capital francesa, Denizard Rivail logo se pôs a exercer o
magistério, aproveitando as horas vagas para traduzir obras inglesas e alemãs,
e para preparar seu primeiro livro didático. Assim é que em dezembro de 1823,
lançou o “Curso Prático e Teórico de Aritmética”, segundo o método de
Pestalozzi. O “Cours d’Arithmétique” (Curso de Aritmética) constitui a primeira
obra de cunho pedagógico e a primeira entre todas as demais dadas a publico por
Rivail. O Futuro codificador do Espiritismo, com apenas dezoito anos de idade,
empregava esforços e talento na preparação do utilíssimo livro, assentando-o em
bases pestalozzianas, mas com muitas ideias originais e práticas do próprio
autor. A obra em questão era recomendada aos instrutores e às mães de família
que desejassem dar aos seus filhos as primeiras noções de aritmética, e primava
pela simplicidade e clareza, qualidades estas que são, aliás, principal mérito de todas as publicações de
Rivail-Kardec. O Método por ele empregado desenvolve gradualmente as faculdades
intelectuais do aluno. Este não se limitava a reter as formulas pela memória:
penetra-lhes a essência, por assim dizer.
Além
dessa obra, Rivail publicou numerosos livros didáticos, bem como planos e
projetos dirigidos à reforma do ensino Francês, numa verdadeira fertilidade
pedagógica, no dizer de Wantuil e Thiesen.
2.2 - O Ensino Intuitivo
Como
não podia deixar de ser, Rivail utilizou-se do ensino intuitivo, processo
didático preconizado por Pestalozzi e, segundo o qual, se transmite ao educando
a realização, a atualização da ideia, recorrendo-se aos exercícios de intuição
sensível (educação dos sentidos), com passagem natural a atividades mentais que
preludiam a intuição intelectual. A ideia existe originariamente na criança, e
a intuição sensível é somente sua realização concreta, único meio de a ideia se
tornar compreensível porque se encontra com força modeladora que vive e atua na
criança. O ensino intuitivo se funda na substituição do verbalismo e do ensino
livresco pela observação, pelas experiências, pelas representações gráficas,
etc., operando sobre todas as faculdades da criança. A base da instrução
elementar de Pestalozzi – afirmou Julien de Paris – é a INTUIÇÃO, que ele
considera como o fundamento geral de nossos conhecimentos e o meio mais
adequado para desenvolver as forçass do espírito humano, da maneira mais
natural.
2.3 – O exercício das funções diretivas e educativas
Tendo
fundado em 1826, em Paris, a Instituição Rivail, o jovem professor aí exerceu funções
diretivas e educativas, desenvolvendo notável trabalho de aprimoramento da inteligência
de centenas de educandos, aos quais ele carinhosamente chamava meus amigos. Deves-se
ressaltar que tanto na Instituição, como em muitos outros de seus
empreendimentos, Rivail pôde contar com o apoio e a dedicação da Professora Amélie-Gabrielle
Boudet, com quem se casara em 1832.
Foi
no decorrer de sua carreira de instrutor-filantropo que Rivail exercitou a paciência,
abnegação, o trabalho, a observação, a força de vontade e o amor às boas
causas, a fim de melhor poder desempenhar a gloriosa missão que lhe estava
reservada. Assim, antes mesmo que o Espiritismo lhe popularizasse e
imortalizasse o pseudônimo Allan Kardec, já havia Rivail firmado bem alto, no
conceito do povo francês e no respeito de autoridades e professores, a sua
reputação de digníssimo mestre da Pedagogia moderna, com seu nome inscrito em
importantes obras bibliográficas.
3
– A missão
3.1 – Os primeiros contatos com os fenômenos mediúnicos
Em meados do século XIX as mesas
girantes revolucionaram a Europa, sobretudo a França, chamando a atenção de
toda a sociedade, inclusive da imprensa. O professor Rivail, estudioso do
magnetismo, assim se expressa, a respeito dos novos fatos:
“Foi em 1854 que ouvi falar, pela
primeira vez, das mesas girantes. Um dia, encontrei o Sr. Fortier, o
magnetizador, que conhecia há muito tempo; ele me disse: Sabeis a singular propriedade
que se acaba de descobrir no magnetismo? Parece que não são somente os
indivíduos que se magnetizam, mas as mesas que se fazem girar e caminhar à vontade.
- É muito singular, com efeito, respondi; mas, a rigor, isso não me parece
radicalmente impossível. O fluido magnético, que é uma espécie de eletricidade,
pode muito bem agir sobre os corpos inertes e fazê-los mover.Os relatos, que os
jornais publicaram, de experiências feitas em Nantes e Marselha, e em algumas
outras cidades, não podiam deixar dúvida sobre a realidade do fenômeno. Algum
tempo depois revi o Sr. Fortier, e ele me disse: "Eis que é muito mais
extraordinário; não só se faz a mesa girar magnetizando-a, mas a faz falar;
interrogada ela responde.
Isto, repliquei, é uma outra questão; crerei nisso quando o
vir, e quando se me tiver provado que uma mesa tem um cérebro para pensar,
nervos para sentir, e que possa se tornar sonâmbula; até lá, permiti-me nisso
não ver senão uma história de fazer dormir. Este raciocínio era lógico; eu
concebia a possibilidade do movimento por uma força mecânica, mas, ignorando a
causa e a lei do fenômeno, parecia-me absurdo atribuir inteligência a uma coisa
puramente material. Estava na posição dos incrédulos de nossos dias que negam
porque não vêem senão um fato do qual não se dão conta.”
“Disso
estava, pois, no período de um fato inexplicado, em aparência contrário às leis
da Natureza, e que a minha razão repelia. Ainda nada tinha visto, nem nada
observado; as experiências, feitas na presença de pessoas honradas e dignas de
fé, me confirmaram na possibilidade do efeito puramente material, mas a idéia
de uma mesa falante não entrava ainda no meu cérebro.”
“No ano
seguinte, era no começo de 1855, encontrei o Sr. Carlotti, um amigo de vinte e
cinco anos, que me entreteve com esses fenômenos durante quase uma hora, com o entusiasmo
que punha em todas as idéias novas. O Sr. Carlotti era Corso, de uma natureza
ardente e enérgica; sempre estimara nele as qualidades que distinguem uma grande
e bela alma, mas desconfiava de sua exaltação. Foi primeiro que me falou da
intervenção dos Espíritos, e me contou tantas coisas surpreendentes que, longe
de me convencer, aumentou as minhas dúvidas. Sereis um dia dos nossos,
disse-me. Não digo não, respondi-lhe; veremos isso mais tarde.
Algum tempo depois, pelo mês de maio
de 1855, me encontrei na casa da sonâmbula, Sra. Roger, com o Sr. Fortier, seu
magnetizador; encontrei o Sr. Pâtier e a Sra. De Plainemaison que me falaram
desses fenômenos no mesmo sentido do Sr. Carlotti, mas num outro tom. O Sr.
Pâtier era um funcionário público, de uma certa idade, homem muito instruído,
de um caráter sério, frio e calmo; sua linguagem firme, isenta de todo
entusiasmo, fez sobre mim uma viva impressão, e, quando me ofereceu para
assistir às experiências, que ocorriam na casa da Sra. de Plainemaison, rua Grange-Batelière, nº 18, aceitei
prontamente.
“Foi lá, pela primeira vez, que fui
testemunha do fenômeno das mesas girantes, e isso em condições tais que não me
era mais possível a dúvida. Vi também algumas tentativas, muito imperfeitas, de
escrita medianímica, sobre uma ardósia, com a ajuda de uma cesta. As minhas idéias
estavam longe de ser detidas, mas havia ali um fato que deveria ter uma causa. Entrevi,
sob essas futilidades aparentes e a espécie de jogo que se fazia desses
fenômenos, alguma coisa de séria, e como a revelação de uma nova lei, que me
prometia aprofundar.
Logo se ofereceu a ocasião de
observar mais atentamente do que não o havia feito ainda. Num dos saraus da
Sra. De Plainemaison, conheci a família Baudin, que morava então na rua
Rochechouart. O Sr. Baudin ofereceu-me para assistir às sessões semanais que
ocorriam em sua casa, e para as quais fui, desde esse momento, muito assíduo.
Essas reuniões eram bastante
numerosas; além dos habituais, ali se admitia, sem dificuldade, a quem pedisse.
As duas médiuns eram as Srtas. Baudin, que escreviam sobre uma ardósia com a
ajuda de uma cesta, dita pião, descrita em O Livro dos Médiuns. Esse modo, que
exige o concurso de duas pessoas, excluía toda possibilidade de participação
das ideias do médium. Ali, vi comunicações seguidas, e respostas dadas às
perguntas propostas, algumas vezes mesmo a perguntas mentais que acusavam, de
maneira evidente, a intervenção de uma inteligência estranha.”
3.2 – Os primeiros estudos sérios de espiritismo
“Foi lá que fiz os meus primeiros
estudos sérios em Espiritismo, menos ainda pela revelação do que pela
observação. Apliquei a essa nova ciência, como o fizera até então, o método da experimentação;
jamais ocasionei teorias preconcebidas: observava atentamente, comparava,
deduzia as consequências; dos efeitos procurava remontar às causas, pela
dedução e o encadeamento lógico dos fatos, não admitindo uma explicação como
válida senão quando podia resolver todas as dificuldades da questão. Foi assim
que sempre procedi em meus trabalhos anteriores, desde a idade de 15 a 16 anos.
Compreendi, desde logo, a seriedade da exploração que iria empreender; entrevi,
nesses fenômenos, a chave do problema, tão obscuro e tão controverso, do passado
e do futuro da Humanidade, a solução do que havia procurado em toda a minha
vida; era, em uma palavra, toda uma revelação nas idéias e nas crenças; seria preciso,
pois,
agir com circunspeção, e não levianamente; ser positivo e não
idealista, para não se deixar iludir.
Um dos primeiros resultados de minhas
observações foi que os Espíritos, não sendo outros senão as almas dos homens, não
tinham a soberana sabedoria, nem a soberana ciência; que o seu saber estava
limitado ao grau de seu adiantamento, e que a sua opinião não tinha senão o
valor de uma opinião pessoal. Essa verdade, reconhecida desde o princípio, me preservou
do grande escolho de crer em sua infalibilidade, e me impediu de formular
teorias prematuras sobre o dizer de um só ou de alguns.
Só o fato da comunicação com os
Espíritos, seja o que for que se possa dizer, provava a existência do mundo
invisível ambiente; era já um ponto capital, um campo imenso aberto à nossa
exploração, a chave de uma multidão de fenômenos inexplicados; o segundo ponto,
não menos importante, era o de conhecer o estado desse mundo, seus costumes,
podendo-se assim se exprimir; vi logo que, cada Espírito, em razão de sua
posição pessoal e de seus conhecimentos, dele me desvendava uma fase,
absolutamente como se chega a conhecer o estado de um país interrogando os
habitantes de todas as classes e de todas as condições, cada um podendo nos
ensinar alguma coisa, e nenhum, individualmente, não podendo nos ensinar tudo;
cabe ao observador formar o conjunto com a ajuda de documentos recolhidos de
diferentes lados, colecionados, coordenados e controlados uns pelos outros.
Agi, pois, com os Espíritos, como o teria feito com os homens; foram para mim,
desde o menor ao maior, meios de me informar, e não reveladores predestinados.”
3.3 – Noticias e desempenho na missão
Em
12 de junho de 1856, pela mediunidade da senhorita Aline C..., o professor
Rivail dirige-se ao Espírito Verdade com a intenção de obter mais informações
acerca da missão que alguns espíritos já lhe haviam apontado: missionário-chefe
da nova doutrina. Estabeleceu-se, então, o diálogo que segue:
Pergunta (À Verdade) – “Bom Espírito, desejaria saber o que pensais da missão que
me foi assinada apor alguns Espíritos; quereis dizer-me, eu vos peço, se é uma
prova para o meu amor-próprio. Sem dúvida, vós o sabeis, tenho o maior desejo
de contribuir para a propagação da verdade, mas, do papel de simples
trabalhador ao de missionário como chefe, a distância é grande, e eu não
compreenderia o que poderia justificar, em mim, um tal favor, de preferência a
tantos outros que possuem talentos e qualidades que não tenho.”
Resposta – “Confirmo o que te foi dito, mas convido-te a muita discrição, se quiseres vencer. Saberás, mais tarde, coisas que te
explicarão o que te surpreende hoje. Não olvideis que podeis vencer, como
podeis falir; neste último caso, um outro te substituiria, porque os desígnios
do Senhor não repousam sobre a cabeça de um homem. Não fales, pois, jamais da
tua missão: esse seria o meio de fazê-la fracassar. Ela não pode ser
justificada senão pela obra realizada, e ainda nada fizeste. Se a cumprires, os
homens te reconhecerão, cedo ou tarde, eles mesmos, porque é pelos frutos que
se reconhece a qualidade da árvore.”
Pergunta – “Certamente, não tenho nenhuma vontade de me gabar de uma missão na qual creio apenas eu mesmo. Se estou destinado a
servir de instrumento para os objetivos da Providência, que ela disponha de
mim; mas, nesse caso, reclamo a vossa assistência e a dos bons Espíritos para
me ajudarem e me sustentarem na tarefa.”
Resposta – “A nossa assistência não te faltará, mas será inútil se, de tua parte, não fizeres o que é necessário. Tens o teu livre arbítrio;
cabe a ti usá-lo como entendes; nenhum homem está constrangido a fazer
fatalmente uma coisa. “
Pergunta – “Quais são as causas que poderiam me fazer fracassar? Seria a insuficiência de minhas capacidades?”
Resposta – “Não; mas a missão dos reformadores está cheia de escolhos e de perigos; a tua é rude, disso te previno, porque é o mundo
inteiro que se trata de agitar e de transformar. Não creias que te baste
publicar um livro, dois livros, dez livros, e permaneceres tranquilamente em
tua casa; não, ser-te-á preciso expor-te ao perigo; levantarás contra ti ódios terríveis;
inimigos obstinados conjurarão a tua perda; estarás em luta contra a
malevolência, a calúnia, a traição mesmo daqueles que te parecerão os mais
devotados; tuas melhores instruções serão desconhecidas e desnaturadas; mais de
uma vez, sucumbirás sob o peso da fadiga; em uma palavra, será uma luta quase
constante que terás que sustentar, e o sacrifício de teu repouso, de tua
tranqüilidade, de tua saúde,e mesmo de tua vida, porque sem isso viverias por
muito mais tempo. Pois bem! mais de um recua quando, em lugar de um caminho
florido, não encontra sob os seus passos senão espinheiros, pedras agudas e
serpentes. Para tal missão, a inteligência não basta. É necessário primeiro,
para agradar a Deus, a humildade, a modéstia, o desinteresse, porque ele abate
os orgulhosos, os presunçosos e os ambiciosos. Para lutar contra os homens é
necessário coragem, perseverança, e uma firmeza inabalável; é preciso também da
prudência e do tato, para conduzir as coisas a propósito, e não comprometer-lhe
o sucesso por medidas, ou por palavras, intempestivas; é preciso, enfim, do devotamento,
da abnegação, e estar pronto para todos os sacrifícios. Vês que a tua missão
está subordinada a coisas que dependem de ti.”
Após
o diálogo com o Espírito Verdade, estando mais lúcido sobre o que lhe
competiria fazer daí para adiante, Rivail elevou a Deus uma prece, revelando
humildade e total submissão aos desígnios superiores.
“Senhor! Se vos dignastes lançar os
olhos sobre mim para o cumprimento de vossos desígnios, que seja feita a vossa vontade!
A minha vida está em vossas mãos, disponde do vosso servidor. Em presença de
uma tão grande tarefa, reconheço a minha fraqueza; minha boa vontade não
faltará, mas, talvez, as minhas forças me trairão. Supri a minha insuficiência;
dai-me as forças físicas e morais que me forem necessárias. Sustentai-me nos
momentos difíceis, e com a vossa ajuda, e a de vossos celestes mensageiros,
esforçar-me-ei para corresponder aos vossos objetivos.”
No
que diz respeito ao teor do diálogo travado com o Espírito Verdade, Kardec
registra, dez anos depois, as seguintes observações:
“Escrevo esta nota em 1º de janeiro
de 1867, dez anos e meio depois que esta comunicação me foi dada, e constato que
ela se realizou em todos os pontos, porque sofri todas as vicissitudes que me
foram anunciadas.Fui alvo do ódio de inimigos obstinados, da injúria, da
calúnia, da inveja e do ciúme; libelos infames foram publicados contra mim; as minhas
melhores instruções foram desnaturadas; fui traído por aqueles em quem coloquei
a minha confiança, pago com a ingratidão por aqueles a quem prestei serviço. A
Sociedade de Paris foi um foco contínuo de intrigas urdidas por aqueles mesmos
que se diziam por mim, e que, fazendo cara boa diante de mim, me dilaceravam
por detrás. Disseram que aqueles que tomavam o meu partido eram assalariados
por mim com o dinheiro que eu recolhia do Espiritismo. Não mais conheci o
repouso; mais de uma vez sucumbi sob o excesso de trabalho, a minha saúde foi
alterada e a minha vida comprometida.
No entanto, graças à proteção e à
assistência dos bons Espíritos que me deram, sem cessar, provas manifestas de sua
solicitude, estou feliz em reconhecer que não senti, um só instante, o
desfalecimento nem o desencorajamento, e que constantemente persegui a minha
tarefa com o mesmo ardor, sem me preocupar com a malevolência de que era
objeto. Segundo a comunicação do Espírito Verdade, deveria esperar tudo isso, e
tudo se verificou.
Mas também, ao lado dessas
vicissitudes, que satisfação senti vendo a obra crescer de modo tão prodigioso!
Com quantas doces consolações as minhas tribulações foram pagas! Quantas
bênçãos, quantos testemunhos de real simpatia, não recebi da parte dos
numerosos aflitos que a Doutrina consolou! Esse resultado não me fora anunciado
pelo Espírito Verdade que, sem dúvida, desejou não me mostrar senão as dificuldades
do caminho. Quanto não seria, pois, a minha ingratidão se eu me queixasse! Se
dissesse que há uma compensação entre o bem e o mal, não estaria com a verdade,
porquanto o bem, entendo as satisfações morais, superaram muito sobre o mal.
Quando me chegava uma decepção, uma contrariedade
qualquer, elevava-me, pelo pensamento, acima da Humanidade; colocava-me, por
antecipação, na região dos Espíritos e, desse ponto culminante, de onde
descobria o meu ponto de atraso, as misérias da vida deslizavam sobre mim sem
me atingir. Fizera-me disso um tal hábito que os gritos dos maus jamais me
perturbaram.”
3.4 – O nome Allan Kardec
Quando
da publicação de O Livro dos Espíritos, o autor se viu diante de um sério
problema: Como assinar o trabalho? E mais uma vez prevaleceu o bom senso do
professor Rivail, segundo se depreende das palavras do biógrafo:
“No momento de publicá-lo – diz H. Sausse,
o Autor ficou muito embaraçado em resolver como o assinaria, se com seu nome,
ou com um pseudônimo. Sendo o seu nome muito conhecido do mundo cientifico, em
virtude dos seus trabalhos anteriores, e podendo originar confusão, talvez
mesmo prejudicar o êxito do empreendimento, ele adotou o alvitre de o assinar
com o nome Allan Kardec, nome que, segundo lhe revelara o guia Zéfiro, ele
tivera ao tempo dos druidas.”
3.5 – As obras Espíritas
Além
de O Livro dos Espíritos, saído a lume em 18 de abril de 1857, Kardec escreveu
muitas outras obras espíritas, das quais se destacam: A Revista Espírita; O que
é o Espiritismo; O Livro dos Médiuns; O Evangelho Segundo o Espiritismo; A Gênese.
Após a sua desencarnação, foi publicado em 1890, em paris, por P. G. Laymarie,
o livro Obras Póstumas – Coletânea de escritos do Codificador do Espiritismo.
Não
menos importante é a correspondência, mediante a qual Kardec estabeleceu
contato com escritores, políticos, eclesiásticos, sábios, pessoas de todas as condições
e de todos os lugares, esforçando-se por consolar, satisfazer e instruir,
abrindo às almas aflitas e torturadas as ridentes e doces perspectivas da vida
supraterrestre.
3.6 – A atuação de Kardec na codificação da Doutrina Espírita
É
voz geral entre os estudiosos da Doutrina Espirita – no que diz respeito ao
trabalho da codificação – que Kardec não foi simples compilador, tendo sua
tarefa ido muito alem da coleta e seleção do material, isto é, das mensagens
recebidas do mundo espiritual. Sobre este assunto, Wantuil e Thiesen fazem os
seguintes comentários:
“Conquanto Kardec sempre repetisse
que o mérito da obra cabia todo aos Espíritos que a ditaram, não é menos
verdadeira que a ele é que coube a ingente tarefa de organizar e ordenar as
perguntas (e que perguntas!) sobre os assuntos mais simples aos mais complexos,
abrangendo variados ramos do conhecimento humano. A distribuição didática das
matérias encerradas no texto; a redação de comentários às respostas dos Espíritos,
os quais primam pela cisão e pela clareza com que foram expostos; a precisão com
que intitula capítulos e subcapítulos; as elucidações complementares de sua
autoria; as observações e anotações, as paráfrases e conclusões, sempre
profundas e incisivas; e bem assim a sua notável Introdução – tudo isso atesta
a grande cultura de Kardec, o carinho e a diligencia com que ele se houve no
afanoso trabalho que se comprometera a publicar. Kardec fez o que ninguém ainda
havia feito: foi o primeiro a formar com os fatos observados um corpo de
Doutrina metódico e regular, claro e inteligível para todos, extraindo do
amontoado caótico de mensagens mediúnicas os princípios fundamentais com que
elaborou uma nova doutrina filosófica de caráter cientifico e de consequências morais
ou religiosas.”
4
– A desencarnação
“Trabalhador infatigável, sempre o
primeiro e o último no trabalho, Allan Kardec sucumbiu, no dia 31 de março de
1869, em meio dos preparativos para uma mudança de local, necessitada pela
extensão considerável de suas múltiplas ocupações. Numerosas obras que estavam
no ponto de terminar, ou que esperavam o tempo oportuno para aparecerem, virão
um dia provar mais ainda a extensão e a força de suas convicções.
Morreu como viveu, trabalhando. Há
muitos anos, sofria de uma doença do coração, que não podia ser combatida senão
pelo repouso intelectual e uma certa atividade material; mas inteiramente
dedicado à sua obra, recusava-se a tudo o que podia absorver um dos seus
instantes, às expensas de suas ocupações prediletas. Nele, como em todas as
almas fortemente temperadas, a lâmina gastou a bainha.”
Acerca
da luminosa existência do mestre Lionês, escreve o Irmão X (Humberto de
Campos):
“Allan Kardec, apagando a própria
grandeza, na humildade de um mestre-escola, muita vez atormentado e desiludido,
como simples homem do povo, deu integral cumprimento à divina missão que trazia
à terra, inaugurando a era espírita-cristã, que, gradativamente, será
considerada em todos os quadrantes do orbe como a sublime renascença da luz
para o mundo inteiro.”
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